[sc:review nota=4]

Se eu disser que há vários episódios atrás (nos primeiros mesmo) eu já tinha pensado na hipótese de haver alguém com poder de viajar no tempo? Eu sei que é convenientemente demais eu dizer isso só agora, então não acredite em mim se não quiser. O anime teve dois momentos distintos: uma sequência de episódios fechados, meio cotidianos, do “adolescente poderoso da vez”, e depois a grande tragédia da Ayumi. Eu sempre tive mais o que falar e não quis correr o risco de pagar de bobo por lançar uma especulação com fundamento tão frágil. Por isso agora eu pago de bobo por não ter falado nada antes. Oh, bem.

Não vou dizer que foi desde o primeiro episódio, mas foi lá pelos primeiros sim que achei que a animação de abertura (sim, esse era meu melhor argumento) evocava algo de ficção científica, com o tema “tempo”, música fortemente cadenciada e uma animação cheia de distorções. Há um relógio em determinado momento, noutro um mp3 player gira no ar como se o tempo ao seu redor tivesse parado, e até a Yusa e o Takajou balançam sincronizados como pêndulos. Isso tudo em um anime de ficção científica que envolve adolescentes com poderes paranormais. Eu há muito tempo penso em viagem no tempo, e pensei mais forte quando quis acreditar que a Ayumi não tinha morrido, ou que ainda poderia ser salva. Bom, eu estava certo. Mas como deve ter notado, minha base para levantar essa hipótese era muito rasa. Nos primeiros episódios não tinha porque eu falar sobre isso já que estava esperando o anime tomar um rumo. Quando ele tomou um rumo foi grave demais. Me desculpe por não querer “dar esperanças” potencialmente vãs para ninguém. Acho que alguns falaram comigo depois da morte da Ayumi e a hipótese surgia, e embora eu não a descartasse, sempre fiz questão de dizer que não acreditava que seria o caso. Exceto por ter sido um pouco rápido demais, o anime lidou bem com a questão do trauma e recuperação do Yuu, Charlotte adotou uma postura muito mais emotiva naqueles episódios, então como eu poderia falar de ficção científica? Nada apontava nesse sentido. Quero dizer, nada exceto a abertura e essa sensação que me perseguia desde os primeiros episódios.

Em que pese eu ter gostado desse episódio e do novo rumo do anime, não posso deixar de apontar um problema que ele trouxe e outro que ele escancarou. Começo pelo último. Charlotte sempre foi imprevisível, não por astutamente esconder as pistas do que estava para acontecer, mas porque simplesmente não tocava no assunto mesmo. Quando chegava a hora, o episódio de acontecer, acontecia e pronto. Exceto no arco da morte da Ayumi e recuperação do Yuu, nenhum episódio terminou com uma deixa para o próximo, todos foram bastante auto-contidos. Isso é um problema quando você está contando uma história. As coisas aqui estão se encaixando por justaposição, por simples sequência temporal, e não por lógica em um enredo bem amarrado. Até um anime como Ushio to Tora, até agora rigorosamente episódico, vem deixando pequenas pistas sobre seus elementos mais importantes ao longo dos episódios. Quando foi que Charlotte deu a pista sobre o poder e o destino da Ayumi? No próprio episódio onde tudo aconteceu. Mas não vou dizer que isso é necessariamente ruim, tem a sua graça assistir um anime assim. É como se fosse um slice-of-life com história.

E por isso esse episódio introduziu um novo nó na coerência do roteiro: com tragédias e super-poderes, e não apesar deles, Charlotte vinha sendo um divertido slice-of-life. Era um anime emotivo onde acompanha-se basicamente um personagem enquanto ele passa pelas dificuldades comuns da adolescência (e por algumas bastante incomuns também). Em parte era por isso que apesar de tudo a Tomori era uma incógnita até o episódio anterior: essa era a história do Yuu. Bom, agora continua sendo a história do Yuu, mas não mais uma história do cotidiano, e sim uma (finalmente) ficção científica de ação. É uma mudança drástica demais para ser engolida assim, foi um ponto de inflexão e tanto no enredo. Mas repito, achei divertido. Ainda que pareça dois animes diferentes compartilhando personagens e colados à força um ao outro, continuo gostando desses Charlottes. Se é ficção científica que ele vai me mostrar agora, ficção científica que seja.

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