E dragões!!! Onde habitam? Como vivem? O que comem? Hoje – melhor: agora – no Anime21. Depois de alguns longos dias de expectativas em cima do desfecho da nossa protagonista, nossa resenha semanal de Mahou Tsukai no Yome está de volta e prometo destrinchar as nuances desse episódio que nos aproxima cada vez mais do universo fantástico da Islândia japonesa, seja por incrementar a função de apresentação do universo narrativo, seja por incrementar um pouco de tensão e dimensão psicológica aos pacatos dias da nossa jovem Chise. Com muitas reflexões e uma verdadeira aula de roteiro às luzes de um diálogo entre a consciência de seu fim e o despertar para um novo começo. Um verdadeiro encontro entre dois mundos.

Contato para uma nova perspectiva

Um amplo cenário é aberto diante de nossos olhos, tudo pelo ângulo de alguém que poderia estar facilmente sendo levada por céu acima na boca de algum animal voador gigante. A biodiversidade escancarada traz alguma luz adicional para o âmago da depressiva ruiva. A cada episódio, a relação entre Chise e Elias vai se tornando cabalmente mais forte – mesmo que demonstrada de maneira sutil e gradual –, trazendo para o expectador um clima agradável e com uma metassimilhança (uma espécie de verossimilhança dentro dos propósitos, espectros e possibilidades particulares de cada universo) bastante plausível.

Intenção e socorro

Esse tipo de episódio pode muito bem se enquadrar na categoria de reativo ou reflexivo. Seu roteiro foi delineado para transmitir a quem assiste o máximo de construção e aprofundamento das intenções (pelo menos até onde a obra se propõe nesse momento) da protagonista. Ao mesmo tempo, o diretor nos transporta para um mundo escondido dos humanos, protegido por um mago e que está precisando da ajuda de Elias. Interconexões narrativas se mostram ótimas formas de extrapolar o enredo e são realmente multifuncionais.

É, de certa forma, e guardadas não apenas as devidas proporções como também as intenções do anime que ainda estão por vir, muito interessante pensar no arco de Chise. Ela saiu de uma escrava auto-induzida no episódio 1 (demarcando seu máximo ponto de desprendimento consigo, com seus interesses, seu passado, suas perspectivas e com os outros) para alguém que consegue “socializar” de uma maneira relativamente desenvolta na medida em que reluta em se deixar cair (ou aceita auxílio); tenta se encontrar – ou ao menos um elo de interesse para com o mundo em relação a sua existência nele. Assistir a esse processo tem sido bem interessante, porque apesar de alguns pesares, a gradação e a profundidade psicológica que o autor conseguiu imprimir em tão pouco tempo (um quarto de temporada – desconsiderando as OVAs) a uma personagem que já tinha desistido de sua essência é admirável.

O ciclo

As tentativas, nesses episódios exploratórios e preparativos, de Chise se encontrar levam sempre a diálogos dos quais se pode tirar algo proveitoso. O ponto alto desse episódio foi a perspectiva de um dragão que viveu muitos séculos a uma jovem, em que o tema da fugacidade e efemeridade da vida é (ou pode ser) uma escolha em contrapartida à possibilidade de se tornar matéria fundamental na cadeia de ciclos naturais que continuará gerando novas vidas e histórias a partir de uma razão (ou energia motivadora) anterior e superior (sendo transcendente e não necessariamente imanente) às existências individuais que vivem, gerando, assim, uma partida não apenas fértil como também tranquila e livre de medos, receios e arrependimentos.

Lição de como morrer

Uma nova perspectiva dessa magnitude sobre a psique da jovem Chise me parece ser um ponto crucial para uma modelagem significativa na sua personalidade para os próximos conflitos que ela com certeza irá enfrentar. O caráter expositivo dessa cena funcionou muito bem pra mim. Foi fluído, conciso, bem subjetivo e realmente fundou um novo jeito de ver o mundo – no sentido de não ter me parecido forçado ou banal. O episódio todo conseguiu construir muito bem um ambiente adequado para que essa cena se encaixasse com o todo, sobretudo com os choques internos da jovem com seus demônios do passado.

E dando ao monólogo norteador seu absoluto ápice: “Os vivos não devem invejar os mortos”. Como seria o diálogo entre uma jovem que tem tudo pela frente e não se importa com sua vida e um dragão milenar que encara a morte como uma velha amiga? Essa comunhão aparentemente dicotômica nos ensina como a vida está pautada em ciclos e como as existências individuais também o estão. E isso é evidenciado no potencial que Chise tem para voar (como o pássaro na kanji de seu nome). Esse é seu ponto (ou o mais próximo disso desde então) de inflexão. Da sua curva. Da curva da sua trajetória e da sua perspectiva sobre a vida (e consequentemente, sobre a morte). É o ponto onde vida e morte, onde consciência para consigo e desprendimento para consigo se cruzam na forma de uma varinha, criando esse elo entre passado e presente. Paz na morte gerando paz nas vidas. Ou pelo menos seus frutos.

A árvore que materializa a nova Chise (?)

Eu admito que esse anime tem me desafiado semanalmente a escrever coisas interessantes, tirar reflexões legais, fazer inferências (e de vez em quando algumas especulações aqui e ali). Contudo, hoje todas as dificuldades que passei tentando escrever para vocês valeram a pena. Fazia um tempo considerável que eu não me deparava com uma capacidade funcional de um discurso/diálogo/monólogo em um anime conseguir criar em mim um sentimento de plenitude ao admirar algo bem feito e pensado. O episódio foi perfeito. Sua construção, seu ápice e, principalmente – sendo, particularmente, um dos motivos primordiais que assistir ou ler tem sobre mim – o que eu posso tirar de reflexivo e construtivo disso. Bem, depois disso eu não tenho mais palavras, apesar de ter lhes dado centenas delas com muita satisfação. Minha inexorável (e raríssima) nota 5,0 para este episódio.

Urayamashii…

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