Em seu segundo episódio Harukana Receive conclui com maestria seu arco introdutório e aponta um valoroso caminho para o seu desenvolvimento. Já era esperado que as primas formassem dupla, mas a forma como isso se solidificou, e também o jeito como aproveitaram os personagens e o drama em foco, foi o que fez esse episódio ser não apenas divertido, mas também gratificante e entusiasmante!

“Fugir” é algo que pode te atormentar pelo resto da vida mesmo…

O episódio começa com um flashback que expõe de forma natural o problema da Kanata quanto ao vôlei, o que já dá a pista para o drama da garota e o ressentimento com a Narumi. Porém, a direção foi inteligente ao não prolongar esse momento, mas se valer do humor gerado pela alegre Haruka a fim de transmitir uma leveza agradável antes de focar no treinamento e em dramas de personagens.

Enquadrar uma bunda ou os seios até pode ser considerado fanservice, mas esse é um anime de vôlei de praia, não é mesmo? Não seria natural elas jogarem de maiô, e muito menos não demonstrarem quaisquer problemas com relação aos seus corpos e biquínis. A exposição física não é um problema se for levada mais para o lado da comédia que da sensualidade – é exatamente o que faz a produção.

Sem deixar de lado a comédia, mas agora focando no treinamento, o episódio progride e a estratégia bolada pela Kanata aponta sua tentativa de pensar um passo à frente das campeãs colegiais, mas não só isso, ela também expõe o temor da garota em ser aquela a receber ou atacar, o que, dada a altura dela, é compreensível se ela já tiver passado por alguma situação traumática referente a isso, o que é bem explorado no flashback completo do início do episódio. Pelo fato de a explorarem no saque e de ela ter dificuldade com bloqueios altos, ficou claro que com o tempo o fato de ela ser um alvo a tirou a confiança para receber a bola, tendo que se apoiar nas qualidades de sua parceira alta e mais forte.

Attack on Harukana Receive. Desculpa, não consegui perder a piada.

Quando vi o contraste físico entre a Haruka e a Kanata, logo pensei que explorar essa diferença seria interessante, já que em esportes que têm biótipos ideais – em vôlei e basquete isso é muito comum – praticantes que se distanciam disso sofrem mais para se igualar a quem tem o corpo ideal. O drama da Kanata parte disso, da perda de confiança nela mesma, a qual provocou a cisão da sua dupla com a Narumi, e o sentimento de impotência da ex-parceira por não ter sido capaz de “salvar” sua amiga.

É um drama extremamente palpável dentro do esporte e que denota tempo e o restabelecimento de um vínculo de confiança para que a esportista seja capaz de acreditar novamente em si mesma e não tenha mais medo de se arriscar independentemente do seu corpo. A cena anterior à partida não poderia ter vindo em melhor hora, pois colocou tudo o que comentei acima em palavras usando bem a personagem que estava mais apagada até aqui, Ayasa – parceira da Narumi. Ela falou o que queria sem papas na língua, demonstrando personalidade e gentileza tanto para com sua parceira, quanto para com a nova dupla. Foi uma ótima forma de aproveitar a garota dentro do que a trama precisava.

Uma namorada possessiva assim não é tão ruim, né…

Outro achado excelente que saiu desse momento foi o que a Ayasa disse e explicou bem o porquê da Narumi ser tão antagônica a existência de um Ace. Era por experiência própria, ela não achava que o Ace era algo positivo, pois viu como isso desequilibrou a sua dupla, o que dificultou o caminho dela para fazer o que a Haruka estava tentando fazer naquele momento: recuperar a confiança da Kanata.

Sabia que ia ter flashback dessa cena e que ela era, de certa forma, importante.

A rispidez dela no primeiro episódio também foi uma pontinha de inveja, some isso ao ressentimento e está explicada a forma como a Narumi agiu. Por outro lado, a Haruka “caiu de paraquedas” no meio de toda essa história, mas não é apenas uma cabeça-oca que quer se exercitar, pois percebe a aflição da prima e, mesmo assim, decide confiar nela, o que é essencial para a Kanata buscar mudar, e para isso ela não precisa e nem deve esquecer o passado, mas encará-lo para ter futuro no vôlei de praia.

Um passado a se orgulhar, e um futuro a se conquistar, ainda que separadas, na areia! ❤

Com tudo dito e feito, e uma ponte erguida para o restabelecimento da autoconfiança da Kanata, a partida começa, e o anime mostra que não está preocupado apenas com o trabalho de personagens, mas também com as partidas de vôlei. A ótima trilha sonora ajuda e muito a entrar no clima, mas é a animação que define o que é o confronto: emocionante, digno do trabalho de personagens da obra.

A plasticidade dos movimentos; a atenção a detalhes como: a movimentação da areia, dos cabelos e da bola; e a consistência nos designs. Tudo é muito bem feito e condizente com uma partida de vôlei de praia real. Mandaram bem na sonoplastia e também nos cortes de câmera, detalhes importantes tanto para facilitar a imersão, quanto para divertir e tornar a disputa mais envolvente para o público.

A partida avança e chegando na reta final a antecipação da estratégia das desafiantes faz com que seja necessário mudar a forma de jogar caso a Haruka e a Kanata queiram marcar um ponto. Há jeito melhor de propiciar um avanço para a superação desse trauma senão a necessidade de enfrentá-lo a fim de cumprir o objetivo? É com a “corda no pescoço” que a Haruka cede sua recepção à parceira, o que acaba em um ponto perdido – é muito comum no vôlei esse primeiro erro ao se optar por outra estratégia – e a necessidade de marcar ou marcar no próximo!

Um momento crucial para a partida e para a Kanata, que, por toda a confiança nela depositada, é impelida a se mover em direção a bola e a recebê-la, passando para a companheira a missão de fazer o levantamento, o que, inteligentemente, não acontece, pois como a Haruka bem aponta, ela não aprendeu o movimento. O que também é uma maneira do roteiro dizer que esse é só o pontapé inicial para resolver o trauma da Kanata, mas não resolverá tudo em uma jogada, além de não ter dado um desfecho previsível a partida com uma matadora bola de segunda.

A reação da Narumi ao constatar que a sua ex-parceira foi capaz de receber a bola, que antes tanto evitava, foi natural dada a insatisfação que ela tinha para consigo mesma por não ter sido capaz de ajudar a amiga. Suas lágrimas são de frustração, mas também demonstram sua gentileza, pois, ainda que tenham se distanciado, a Narumi não deixou de pensar na Kanata e mesmo que nesse primeiro momento ela se sinta mal por ter falhado, acredito que depois ela ficará feliz pela volta da sua “ex”.

Ainda se faz necessária uma conversa franca entre as ex-parceiras, mas para uma introdução em dois episódios já foi mais que o suficiente, pois, tirando a clara e boba opção de não mostrar um homem nessa história – o avô foi comprar cigarro ou pescar? –, não tenho do que reclamar desse começo – principalmente desse excelente segundo episódio. Que a “treinadora demônio” continue ensinando a sua pupila e que mais desafios surjam no caminho das primas para que essa dupla se firme de vez!

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