Em seu episódio final, Chio-chan no Tsuugakuro entrega duas esquetes consistentes que, se não abraçam a energia insana do início, seguem a linha de um investimento maior em suas personagens, aproveitando as situações para apresentar novos aspectos sobre eles. Além disso, a obsessão por calcinhas ao qual o programa se rende a partir de sua metade, ganha um segmento dedicado a elas, ou melhor, a falta delas. É uma sequência com bons momentos, realmente hilários, principalmente por causa do jogo de tensão despertado por uma nova característica da personalidade de Yuki. E, para completar, há um trailer que funciona como a prévia de uma segunda temporada, contendo uma espécie de spin-off comandado por Chiharu, em uma guerra de kancho com um grupo de sete garotas, e erros de gravação que anunciam Chio-chan no Tsuugakuro como um programa de TV, em uma interessante metalinguagem, com direito a beijo na boca – não intencional, obviamente – entre Chio e Manana.

A primeira parte traz Chiharu procurando Chio-chan em busca de ajuda para um trabalho escolar. Em uma atividade de Estudos Sociais, o professor pede para que os alunos articulem um modo de ganhar 500 ienes em 24 horas. Claro que ambas têm segundas intenções no gesto de aproximação. Chiharu quer saber um pouco mais sobre aquela que “virou a cabeça do seu irmão” e Chio vislumbra a oportunidade de demonstrar inteligência e impressionar a menina.

Após cada uma delas estabelecer sua posição, Chio coloca em ação o seu plano para conseguir os 500 ienes: coletar latinhas e vendê-las para reciclagem. Aos poucos, as garotas vão se entrosando. Mas Chio começa a exibir um conhecimento sobre o processo que não corresponde à realidade. A jovem tem a sua “filosofia de vida”, a de viver abaixo do mediano, porém sempre se mete em situações complicadas por aspirar algo a mais e não gostar de perder. Por pretender aparentar e convencer Chiharu que possui uma sabedoria de senpai, ela atravessa a linha que instituiu e deixa-se conduzir pelo entusiasmo.

Chiharu buscando ajuda de sua adversária (e examinando-a). Isso vai terminar em vexame!

A surpresa vem quando ela descobre o valor pago pelas latas – as não amassadas e as mais leves são as que são valorizadas, contrariando tudo o que havia informado à Chiharu. Seu plano desce pelo ralo, o que a faz perder a compostura e chorar feito uma criança. Chio-chan, nesse segmento, é a sua pior inimiga. Ao desabar em lágrimas, ela expõe as suas fraquezas para a menina, mas, ainda assim, não admite seu erro com sinceridade.

A “sabedoria” de ensinar errado: Chio-chan desinforma Chiharu sobre reciclagem.

No caminho, elas ainda cruzam com Manana, que está em uma enorme fila aguardando a sua vez de comprar em uma loja. Chio a repreende e consegue retirá-la da fila. No entanto, Manana vende o seu lugar e obtém uma excelente quantia na transação. É claro que Chio-chan não aceitará passivamente o seu fracasso e reivindica a sua parte no negócio “escuso” da amiga. Diante dos olhos de Chiharu, os defeitos de Chio-chan aparecem de forma cristalina.

O fracasso nas vendas e o choro. Chio-chan em um momento “que se dane a dignidade”.

Dois pontos relevantes do esquete: Chio mais uma vez se sabota ao fugir de sua regra de não se destacar. O seu choro é uma daqueles casos de perda da dignidade. É um dos melhores momentos da primeira metade do episódio, que, se não é um show primoroso de comicidade, atinge alguns pontos altos no risômetro. O outro ponto diz respeito às formas de ganhar dinheiro: o valor irrisório pago pelas latas, que representa pouco para o orçamento de quem precisa correr atrás do pão de cada dia. E o modo como Manana obtém um resultado satisfatório sem esforço e de maneira irregular. Trabalho e ética sendo importante para a composição do texto, no entanto, o humor não tem peso suficiente para se impor como um comentário social.

O segundo segmento é o mais engraçado, com Yuki tendo os holofotes para si e a série focando em sua obsessão por calcinhas de maneira engraçada e sem ser apelativo no que tange ao fanservice.

Chio-chan e Manana conversam sobre o streaking, que é a prática de correr nu em locais público, como forma de protesto ou para chamar a atenção. Yuki fica encantada com o que ouve e se diz adepta de um estilo de vida naturista, inclusive andando nua em casa. Chio fica surpresa e preocupada com Yuki (e consigo mesma, já que a popularidade de Yuki significa menos risco de bullying), só que antes de sugerir a ela que não comentasse isso a ninguém, Manana se declara partidária da prática (um engodo descarado). A trapaça da estudante traz à tona a face intimidadora de Yuki, já que esse estilo de vida, o mesmo dos seus pais, é fundamental em sua formação social, então ela não aceitará que vire motivo de zombaria.

Yuki ativa o modo assustadora: “Não mexa com meu modo de vida!”.

Mais uma característica de Yuki é explorada. Além de ser alegre, gentil e sincera, ela pode também provocar medo. A tensão entre Manana e a garota é divertida. E o que poderia ser um desastre para Manana se torna um momento de liberdade compartilhado entre amigas.

O que há de elogiável na sequência é que um provável momento de constrangimento se transforma em um ato de diversão e autonomia. Elas se sentem livres nos breves instantes em que brincam uma com a outra. E tal felicidade leva Chio a sentir ciúmes por ver Manana empolgada e sorridente. Ela também decide retirar sua calcinha e fazer o caminho para a escola sem a peça íntima, partilhando com Manana e Yuki a alegria de não se sentir restringida por imposições sociais/de vestuário.

O reinado da calcinha começa a ruir: liberdade para as borboletas!

Um ponto positivo é que a cena se desenrola sem a presença de depravados ou voyeurs. Entretanto, temos Kushitori-senpai, que surge para ser o maior perigo no trajeto. Ela sente o frescor da juventude no ar e propõe um desafio de kabaddi. Infelizmente, os trejeitos que a aproximam do estereótipo de uma abusadora/pervertida estão presentes, porém, não atrapalham o trecho, e sua aparição não chega a ser incômoda como em outras ocasiões. Depois de escaparem de Kushitori, Chio e Manana presenciam a felicidade de Yuki pela notícia de que a multa pela transgressão de correr nua não é impossível de ser paga. Um arremate travesso.

É interessante o desprendimento de Yuki. O seu desejo de correr nua não tem relação com vício ou confrontação a uma regra social, mas com liberdade. E ela se sente confortável com o olhar alheio, sendo que não há nisso orgulho ou vaidade. Yuki é uma personagem divertida, que, ao considerarmos o elenco, parece subaproveitada pela série.

Chio e Manana bem posicionadas. Se fosse yuri, seria o paraíso na terra.

Chio-chan no Tsuugakuro oferece como ato final um trailer de uma suposta segunda temporada, em que brilha Chiharu e uma gangue de kancho. E, por fim, erros de gravação. Uma ideia criativa mostrar os bastidores da filmagem, apresentando os “acidentes” de Chio-chan, incluindo aí um beijo involuntário entre as protagonistas. O navio yuri não sai do porto durante a temporada… Esse beijo nos extras não conta.

É um desfecho agradável, com risos garantidos, ainda que seguros, sem se arriscar pelo caos do absurdo – que seria bem-vindo. Chio e Manana exibem novamente a incrível química que as une, e, desta vez, com uma iluminada Yuki como companhia. As situações não são de todo equilibradas, sendo que o segundo esquete é mais fluído e hilário que a tentativa de sintonia entre Chio e Chiharu.

Chio-chan no Tsuugakuro, assim como o seu episódio 12, é divertido, mas não absolutamente impagável como muitos de seus momentos chegaram a apontar. Não que fique um sabor agridoce, porém é inevitável pensar que um pouco mais de loucura e criticidade fariam toda a diferença.

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