Hakata Tonkotsu Ramens – ep 12 final – Sobre escolher as amizades
Bom dia!
Diz-se que amigos são a família que escolhemos. Como tudo o que escolhemos, podemos ter mais ou menos opções, escolher bem ou escolher mal, segundo esses ou aqueles critérios. E nossas escolhas podem mudar ao longo do tempo também.
Por conta de seu trauma, inicialmente a escolha de Ling era não ter amigo nenhum. Mas se até o Feilang supostamente queria ele de volta, o que fazer?
Eu não acho que Ling tenha duvidado da intenção do Feilang quando o convidou para formar uma dupla com ele. E eu acho que o Feilang estava sendo sincero. Até mesmo alguns psicopatas podem ser sinceros. Eles passaram alguns anos juntos, afinal, ainda que Feilang estivesse planejando trair Ling desde o começo, acho que ele não teria conseguido mentir o tempo todo nem se quisesse. A boa mentira é aquela que engana até quem a está contando. Já menti bastante na vida. Não, não sou psicopata (não, isso não é uma mentira). E uma coisa que eu sei é que nos momentos mais críticos meu estado mental enquanto mentia era exatamente o mesmo de quando dizia uma verdade. Eu acreditava, construía toda uma história em cima daquela mentira, ficava honestamente magoado se duvidassem de mim, e por aí vai. Bom, estou falando no passado mas não é como se eu tivesse me tornado exatamente um deontologista kantiano hoje em dia. Ainda minto. Todo mundo mente.
Feilang estava mentindo aqueles anos todos para o Ling, mas pelo menos em parte daquelas mentiras ele próprio acreditou. Talvez ele estivesse no fim das contas mentindo sobre querer formar uma dupla com Ling nesse episódio, mas de alguma forma ele acreditava nisso. As mentiras do passado, nas quais ele acreditou, o ligaram para sempre ao Ling. Até o fim de sua vida. Mas, como animes parecem gostar de carregar lições de moral, Hakata Tonkotsu Ramens também tem a sua: o que começa como mentira está destinado ao fracasso.
Ling sempre foi honesto com todos seus parceiros, amigos e contratantes. Tão honesto que seu ex-chefe na máfia abusava dele. Tão honesto que disse com todas as letras para o Banba, quando o encontrou pela primeira vez, que estava ali para matá-lo. O Banba também sempre foi honesto, mas daquele jeito meio misterioso dele de ser honesto. Considerando que o Ling é, na prática, o mais próximo a um protagonista que Hakata Tonkotsu Ramens tem e o único personagem que ganha dois arcos de desenvolvimento – o primeiro e o último do anime, nada menos -, não é exagero considerar que talvez a aura de mistério que cerca o Banba seja apenas uma representação simbólica de como o Ling o vê, e não como ele realmente é.
As duas escolhas que o Ling tem, então, são: o Feilang, que ele já conhece e sabe que muito provavelmente irá traí-lo em algum momento se for necessário ou conveniente, e o Banba, que ele conhece muito pouco e considera envolto por uma aura de mistério. Ling não tem motivos para desconfiar do Banba, e isso é o que o perturba mais: e se ele confiar e for traído? Pelo menos no Feilang ele jamais irá confiar para começo de conversa. Como eu escrevi no artigo do episódio anterior, porém, o anime teria se beneficiado se tivesse explorado mais o dilema do Ling. Ao invés, ele já tinha a sua escolha feita desde o final do episódio anterior, então esse episódio final serviu apenas para vermos as consequências dela.
E todo mundo (exceto o Saitou) ajudou o Ling para, ao mesmo tempo, agradar o expectador com ação desmiolada e mostrar como a escolha pelo Banba é vantajosa e correta porque, afinal, ele vem junto com um grupo inteiro de pessoas muito diferentes entre si mas todas confiáveis e dispostas a se arriscar pelos seus amigos sem nada em troca. Aliás, sobre o Saitou, é curioso (e um pouco frustrante) como até mesmo uma criança (a Misaki) participou da missão final, até o velho Genzou revelou (para surpresa de ninguém) que também é um assassino, ainda que já aposentado: o temível Vovô (Jiji)! Cujo estilo é gangster americano da época da Lei Seca, com sobretudo, chapéu e uma metralhadora. Até o médico foi à campo, porque, afinal, ele se tornou expert em carrinhos de controle remoto por causa de suas operações remotas com braços robóticos. Claro. Eu acho que deveriam pelo menos ter levado o Saitou, nem que fosse para na hora H virarem pra ele e perguntarem “o que você tá fazendo aqui?”. Manteria a piada e valorizaria um pouco o personagem. Pelo menos ele (e o Yamato) está lá na ponte na cena final.
Mas o anime foi sobre o Ling, né? E os dois arcos dele foram bons, ainda que com os defeitos que eu já apontei em todos os meus artigos e não sinto necessidade de me repetir aqui. Entre o cinismo da escolha ruim e segura e a esperança da escolha boa mas duvidosa (do ponto de vista dele), Ling escolheu a esperança – olha aí o anime tentando passar lição de moral de novo. Até o próximo … ah, não tem próximo episódio, já acabou. Então até o próximo anime, talvez já um da próxima temporada!