Bom dia!

Esse é um daqueles animes que tem ideias legais mas elas estão ali só de enfeite, né? Até imagino uma conversa entre autor e editor, depois do autor explicar todo o conceito, a ideia de um mundo falso, o interesse intelectual dos personagens, etc. Mais ou menos assim:

Editor: Muito legal, muito legal. E se daí os colegas não despertos virassem tecno-zumbis e perseguissem os despertos?

Autor: Olha, acho que isso não combina muito com …

E: E daí o pica das galáxias saca um revólver gigante e atira neles?

A: Como eu ia dizendo, isso até soa interessante mas …

E: Escreva isso.

A: Sim senhor.

Posso estar enganado, claro, mas é sempre divertido (e romântico) pensar que o pobre do autor tinha uma boa ideia mas só não deu certo porque não permitiram. Na maioria das vezes não é bem assim, mas de vez em quando é. Não que isso importe. Vamos ao artigo em si?

Sobre o segundo episódio, dizer o quê? Foi um longo episódio sobre o que aconteceu imediatamente após o final do primeiro. Muita correria, muitas lutas, yay (que tédio). Serviu para explicar o que é aquele mundo. Sim, é um mundo virtual (isso já estava na sinopse, mas ok). Foi criado pela μ (que no anime pronunciam “Miu”, mas deveria ser “Mu”; vou chamá-la de “Miu” a partir de agora)? Não está claro ainda. Ela parece ter poder sobre o mundo, ou pelo menos acredita ter. E quais são seus habitantes? Além da própria Miu, que é uma inteligência artificial, há humanos e, como se fosse um jogo, NPCs.

NPCs para todos os lados

Primeira coisa interessante: NPCs são, obviamente, programas. Miu também é um programa. A diferença entre ambos é que Miu é um programa de inteligência artificial? Isso é questionável. Os NPCs têm comportamento bastante complexo e precisam aprender a reagir aos personagens, então programas de inteligência artificial seriam adequados para eles também. Não necessário, mas adequado. A diferença fundamental é outra: Miu é um programa desperto. Existe teoria e ficção sobre quando e como uma inteligência artificial desenvolvida pelo ser humano passaria a ter auto-consciência. É preciso programas mais complexos? É preciso mais dados? É preciso mais poder de processamento? Se aceitarmos o conceito de “consciência” e assumirmos que um programa de computador pode eventualmente ter consciência, então é inevitável crer que isso um dia vai acontecer, é inevitável. E o que acontecerá daí? Vai saber. Nos cenários mais dramáticos, as máquinas nos matam (Exterminador do Futuro) ou escravizam (Matrix).

Sem perceber, parece que Miu é do segundo caso. Ela está escravizando pessoas “sem querer”. O que seria muito interessante (máquinas, mesmo despertas, não necessariamente possuem os nossos conceitos morais); ela poderia estar ciente do que está fazendo, saber que as pessoas não vão gostar, mas fazer mesmo assim – porque não se importa ou porque acha que sabe o que é melhor para as pessoas, mesmo que elas discordem. A ideia de uma inteligência artificial amoral é muito interessante. Mas desde o primeiro episódio sabemos que o protagonista tem que “salvá-la”, então não é o caso. Ela está sendo enganada, pobrezinha. Antropomorfizaram a máquina e a fizeram uma vítima. Uma pena.

Miu e uma garota que parece ser a líder dos Músicos

Bom, e quem são os seres humanos dentro desse sistema? Os há em três sabores: os Músicos, que parecem ser em número de oito e estão enganando Miu (são os vilões, enfim), e as pessoas normais, que podem ser despertas ou não. As despertas enxergam o mundo como ele é, o rejeitam, e por isso são uma ameaça à estabilidade do mundo ideal que Miu quer criar. As pessoas não despertas são como todas as pessoas deveriam ser, não percebem que estão dentro de uma realidade falsa, não percebem que estão presas no Dia da Marmota (no caso, os três anos do ensino médio / colegial), e podem ser manipuladas pela música da Miu.

Quero discutir sobre essas pessoas, mas antes, sobre o mundo. É um mundo virtual razoavelmente limitado. É grande o bastante para ser mais do que o suficiente para a vida de um estudante colegial, mas só. Parece que Miu poderia aumentar o mundo, acrescentando mais áreas, mas por alguma razão, nesse momento, ela não pode fazer isso. Mas pode fazer qualquer outra coisa. Manipular o tempo, o espaço, os NPCs, e, usando sua música, até mesmo as pessoas dentro daquele mundo que não tenham despertado. Ela não é onisciente nem onipresente, e talvez mesmo dentro desse espaço limitado não seja onipotente. Ela não é uma divindade, mas é bem perto disso.

Não dá para ir além do “fim do mundo”

Interessante, mas … é só isso. É uma ideia legal, mas já foi exaurida em poucos episódios. Os flashbacks, as estranhezas do protagonista no primeiro episódio, as incongruências, tudo isso era muito interessante para criar um clima de suspense sobre qual a natureza do mundo. Mas o anime já entregou tudo. Quando Ritsu decide passar um episódio inteiro tentando racionalmente entender o que é o mundo onde ele está, isso já é assunto velho para a gente que está assistindo. Ele fica parecendo só um idiota – principalmente depois de tudo o que viu e testemunhou em primeira mão. O final do segundo episódio em especial poderia ter sido tão chocante se o anime não tivesse já entregado o jogo. Mas alguém achou que um bishounen com um revólver gigante lutando contra tecno-zumbis era mais legal. Então tá.

O que ainda pode ser interessante então são os personagens, e o terceiro episódio, em especial o arco da Mifue, foi muito legal nesse sentido. Aos poucos a gente descobre que ela odeia gordos, mas não é que ela odeie gordos, e sim que ela odiava a sua mãe, não porque a odiasse, bem o contrário na verdade, ela gostava tanto que queria poder comer junto com ela mas não conseguia, isso a deixava deprimida, e … enfim, você assistiu. E ao final do episódio ainda não é possível bater o martelo sobre qual seja o problema dela. A gente sabe que algo perturba muito a Mifue, mas talvez tudo aquilo seja só como a mente dela está lidando com o assunto dentro daquele mundo virtual no qual suas memórias foram severamente alteradas. Talvez o problema dela no mundo real não seja a mãe, mas sim a si mesma. Talvez ela tenha compulsão alimentar, se sinta mal com o próprio corpo, se esforce para ser “bonita” – ela faz questão de dizer que não é feia.

E é totalmente possível que Mifue no mundo real seja bem diferente de como ela é no mundo virtual. Sweet-P, que é um velho gordo no mundo real mas uma loli fofa no mundo virtual, disse isso literalmente e é a prova disso se você não quiser acreditar só nas palavras dele. Então sabemos que Mifue tem problemas psicológicos, e sabemos que Ritsu tem problemas psicológicos também porque no primeiro episódio teve flashback dele em um consultório falando sobre isso – e provavelmente é o que explica sua obsessão por psicologia no começo do anime também. Sweet-P parece ter problemas também, e esse, afinal, é um mundo ideal criado por Miu para que ninguém mais sofra. Assistir os problemas reais dos personagens reais vazarem para dentro do mundo virtual deve ser a parte mais divertida desse anime.

Isso dito, e os Músicos, hein? Eles manipulam Miu. Eles a controlam? A fizeram criar tudo isso? Acho improvável. Quero dizer, blogueiros de ramem dificilmente se tornariam conspiradores tecnológicos, não é? O provável é que eles sejam despertos normais, como os demais que eles atacam, que simplesmente acreditam que, mesmo sendo um mundo falso, ainda assim é melhor que o mundo real, e decidiram protegê-lo a todo custo, indo tão longe a ponto de manipular Miu para tanto. O que deixa a questão sobre a origem desse mundo ainda em aberto. Será uma grande conspiração? Miu criou sozinha e “capturou” as pessoas com sua música? É um experimento? Talvez um novo e amalucado tratamento psiquiátrico?

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