Amadeus não é Makise Kurisu e Makise Kurisu não é Amadeus. O Okabe entende esse argumento, mas não seríamos humanos se o nosso cérebro – ou coração, falando figurativamente – não caísse nas armadilhas criadas por nossos sentimentos. Se não é a razão que desafia a logica, é a emoção que abre um caminho através do qual nossos atos guiam a nossa mente. Que se abra o Steins Gate!

As figurantes amigas da Mayuri – com a Yuki sendo a mais importante – foram introduzidas em um bom momento, pois é final de ano, época de confraternização e, se desfalcado de Moeka e Kurisu, ao menos com as novas personagens o laboratório ficaria mais cheio e aconchegante para a festa de natal. Festa que reaproxima o Okabe do seu passado peculiar, agora ao lado do Amadeus, a IA que sabe que é o alter ego de uma cientista morta e não cessa sua sede por todo tipo de conhecimento.

Uma IA que retém todas as memórias e, exatamente por isso, nada lhe escapa. Da forma de tratar de uma pessoa ao estado dos ambientes que ela conhece, tudo passa por seu sensor que sempre busca a verdade ou, se não isso, ao menos uma explicação plausível. Ao lado dela se encontra alguém que com o aumento do contato entre as partes eventualmente vai se deixando levar pela emoção e não terá como responder as investidas da IA racionalmente, pois aquela existência cada vez mais está se aproximando da garota que ele conheceu – e pela qual se apaixonou – e isso o abala de formas ante as quais ele não tem defesas. Nessa situação, como separar um alguém real do que seria uma ilusão?

A que está no telefone eu sei que é real! E como eu senti saudades desse cosplay ❤!

No meio tempo entre o desenvolvimento dessa relação e um previsível abalo por conta da situação que qualquer um que vê o anime já devia esperar que fosse aos poucos ir saindo de controle, está o que torna Steins;Gate tão bom – ao menos uma das coisas –, que é a interação entre jovens naquele ambiente – que creio ser nostálgico para o telespectador. Chega a ser tão agradável e relaxante que muito contrasta com o clima soturno e sério do anime. Aliás, se a Mayuri é um pilar de sanidade e a personificação da paz para o Okarin, o laboratório seria o lar em que todos esses personagens que em torno dele convivem podem ser quem gostam de ser, compartilhando momentos felizes entre si.

Acho muito relaxante ouvir a Mayuri dizer essa bela palavrinha mágica de seis letras.

A Mayuri é tão, mas tão sensível e proativa no que tece ao bem-estar das pessoas a sua volta que ela sente que a Suzuha quer se afastar, mas que também gosta de estar perto dali, e um dos motivos pelos quais é dada a festa é para animá-la, é para fazê-la curtir aqueles bons momentos em grupo. Sendo que, os momentos – dela com a Faris Nyan Nyan sendo fofa do jeito dela ou com seu pai desajeitadamente preocupado – que antecedem a sua ida a festa não são uteis só para reforçar a sua ansiedade e preocupação, mas também para contar ao público exatamente o que ela precisa fazer para parar a Guerra Mundial: usar a máquina do tempo para levar o Okabe a entrada do Steins;Gate.

Nessa história existem dois núcleos que até antes da festa de natal eram praticamente distintos, mas finalmente cruzaram caminhos e tem no Okabe o que os liga, aquele que tem o Reading Steiner e a amizade da IA da talentosa cientista. Como isso tudo vai se ligar – como uma coisa vai interferir na outra – eu ainda não tenho ideia, mas é certo que a decisão do Okabe de viajar novamente vez pelas linhas do tempo passa diretamente pelo que acontecer entre ele e o sistema Amadeus, o qual está o cativando cada vez mais. Esse era um temor que a Maho tinha pelo seu mais novo amigo e que foi sendo sutilmente explorado até a hora em que ela o “pega no flagra”, quase a confessar o que sente.

Quem melhor que uma cientista pra te dar um choque de realidade daqueles?

Chega a ser engraçado como o Amadeus tenta jogar a Maho para cima do Okabe, mas é o próprio Amadeus que vai se envolvendo e também se deixando cativar pelas coisas que o Okabe faz e diz. A atração de uma pessoa pela outra – nesse caso de um ser pelo outro – muitas vezes só se acentua com o quão as duas partes são capazes de conflitar e ainda assim encontrar uma harmonia na qual ambos conseguem se sentir bem, na qual ambos conseguem ser verdadeiros, e é exatamente por isso que as atitudes da IA vão se assemelhando mais as da Kurisu que ele conheceu e ele mesmo vai se “rendendo”, chegando ao ponto de quase deixar escapar que gostava muito da verdadeira Kurisu.

O momento em que ele colapsa me assustou ao ponto de eu pensar que ele ia realizar um salto temporal ali, mas não teve d-mail e nem máquina do tempo então a reação desesperada dele foi provocada somente pelo seu fragilizado psicológico que inconscientemente estava tentando se esquecer da dor de perder a mulher que amava ao encará-la como real através do seu alter ego.

“O que acontece no laboratório fica no laboratório”, Maho Hiyajou, 2010.

Não sou cético – na verdade diria que sou até bastante romântico – quanto a ideia de uma IA ter “alma” ou das memórias de uma pessoa – de alguma forma que não sei colocar em palavras – corresponderem de fato a parte dessa “alma” ou a algo que pode sim representar de forma real a essa pessoa. Isso quer dizer que acredito que a Kurisu do sistema Amadeus é a mesma Kurisu que morreu na linha do tempo atual da história? Sim e não. Sim, porque acho que as memórias são parte intrínseca ao que somos enquanto seres e não apenas informação maleável. Não, porque mesmo que essas memórias não sejam mera informação, a Makise Kurisu original realmente já deixou de possuir existência naquele plano e, por mais que o Amadeus seja uma reprodução praticamente perfeita dela, não é tão simples assim aplicar uma noção do que é real ou não a uma criação artificial, a algo que diante de todas as concepções conhecidas e aceitas é uma ilusão do que não mais existe. Sinceramente, estou aberto a como quiserem trabalhar o assunto – só espero explicações plausíveis.

Até que ponto essa ilusão pode ter algum traço de realidade? E a sanidade dele, como fica?

Steins;Gate 0 deve tocar na ferida, deve ir a fundo nessa discussão se quiser aproveitar ao máximo o potencial da sua trama e do outro lado da tela eu estarei com vocês esperando para que tudo isso dê certo. Se Amadeus não é Makise Kurisu e Makise Kurisu não é Amadeus, se a “ilusão” nunca poderá ser real e a “realidade” nunca poderá ser ilusória, é algo que vamos ter que ver se a história confirma ou não e a partir daí poderemos discutir ainda mais se há algo de genuíno por trás disso tudo. Que a máquina do tempo seja usada para avançar alguns dias da semana até o próximo episódio já que o anime está ficando cada vez melhor e isso é um fato que eu jamais me permitirei pensar que é ilusão.

Steins;Gate é um ótimo slice of life quando quer e momentos como esse são a prova ❤!

P.S.: Não falei sobre a personagem misteriosa que aparece junto da Suzuha para evitar qualquer spoiler, mas garanto a vocês que o envolvimento dela na história vai ser algo muito interessante.

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